31/05/2007

Deficiente Visual apaixonado por Computadores

Por Mayara Evangelista


Em uma garagem da periferia da Zona Leste de São Paulo Carlos Alberto de Souza, 55 anos, exercita sua paixão pelo mundo dos computadores. Com um sorriso no rosto e um olhar vago uma conversa descontraída inicia-se. O local é úmido, mal arejado e sem iluminação, a não ser pela luz natural que passa pelo portão meio aberto. Várias são as caixas de papelão com inúmeros CDs e antigos Lps de Beethoven, Elis Regina, Elba Ramalho. Além de seu velho rádio e seu computador existem apenas dois bancos e uma pequena mesa de madeira. Betão como é conhecido, tem 1,90 de altura, usa óculos de acrílico cinza chumbo que cobre a maior parte do seu rosto. Sentado, com as mãos apoiadas nos joelhos, ele fala com segurança sobre o universo da informática.
Sua vontade de aprender e sentir-se útil fez com que ele superasse barreiras. Alberto nasceu com catarata congênita e aos cinco anos foi submetido a uma cirurgia que contribuiu para melhora da sua visão. Os traços, os objetos e as cores do mundo ganharam maior nitidez, no entanto o problema não foi sanado.
O interesse pelos computadores foi despertado no seu primeiro emprego quando se mudou para Cuiabá, “O computador chegou na empresa e depois de tropeços consegui domá-lo”, ele afirma que foi errando e perdendo muitos arquivos que aprendeu. Embora tenha concluído somente o ensino médio e alguns cursos básicos de informática, Alberto manuseia os programas com destreza e eficiência. Ele conta que aperfeiçoou suas aptidões pela curiosidade e também ouvindo rádio. Inclusive hoje ele informa-se, sobretudo pelos noticiários matutinos da CBN e os programas segmentados da Rádio Eldorado como Plug 700, destinado a dúvidas, dicas de informática. Paulistano morou em Cuiabá durante dois anos, voltou para São Paulo devido ao problema de visual. Somente aqui ele teria melhores condições de tratamento.
Sua vida profissional foi bem diversificada, hoje aposentado Alberto relembra com satisfação as atividades que já exerceu como trabalhos em laboratórios, consultoria de eventos, eletricista e na década de 70, desempregado, quando retornou para São Paulo prestou um concurso publico para o Hospital do Servidor e efetivou-se como ascensorista. Em 1984 sofreu um acidente de carro, no qual resultou a sua aposentadoria por invalidez.
Gradativamente apesar de vários tratamentos, sua visão foi perdendo o brilho. Incapacitado de andar sozinho refugiou-se ainda mais no universo virtual. Por muito tempo fez programações e executou atividades utilizando uma lupa. Atualmente, com menos de cinco porcento de visão ele utiliza leitores de tela para deficientes visuais, Betão informa que esses programas (Narrador de Tela, Dosvos e Edivox) são facilmente baixados da Internet. Tateando o teclado ele mostra o funcionamento dos softwares. Ele mesmo fez a programação de todos os atalhos do teclado. Ctrl, Alt,Del uma voz codificada fala o comando.
Sobre seu convívio social, especialmente no que diz respeito a sua paixão ele diz, “As pessoas acham que eu falo por intuição e não porque eu sei, é como seu eu pendesse a credibilidade” Beto afirma já ter se acostumado com esse tipo de comentário “Falem mal, mas falem de mim”, risos. Por conta dos atropelos da vida nunca namorou, nem se casou, não constituiu família, hoje mora com a irmã, o cunhado e dois sobrinhos.
Para o futuro ele torce que a ciência desenvolva algum tratamento para reconstituir sua visão, tanto é que ele se colocou a disposição para “protocolo de interesse científico” Se conseguir atingir o sonho de ser curado e voltar a enxergar mesmo que seja menos de 50%, ele diz que vai fazer cursos de hardware, e avançados de softwares. Entretanto, com tantos anos de convivência com o problema visual diz “Eu não preciso da vista, porque eu sei como faz, eu conheço o caminho”. Alberto é exemplo vivo de que uma deficiência não é obstáculo para realizações.

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